Bombas nucleares são um risco hoje? Improvável... - Daniel Camargo
Na segunda-feira, 24 de fevereiro de 2022, tropas russas invadiram a Ucrânia, cruzando a fronteira leste, região de Donbass, e a divisa norte, através da Biorrússia.
Tudo levava a crer que se tratava de um passeio, tal a desproporção de forças. Kiev cairia. A parte oriental, Donetsk e Luhansk, seriam incorporadas à Rússia. Isso sem contar a península de Crimeia, que as tropas de Putin já haviam subtraído em 2014.
Some-se a essas conquistas o controle da saída da Ucrânia para o mar Negro, cujos portos são vitais à sua economia.
Não parou por aí. Putin exigiu que as forças armadas ucranianas depusessem o presidente Zelensky, e depois se desarmassem.
Mas as coisas não deram muito certo para a Rússia. Semanas viraram meses, e há estamos há 2 anos com a guerra em nossa rotina (imagine para os ucranianos). A cada dia que passa, tropas da Ucrânia, que estão defendendo solo pátrio, recuperam alguma região ou cidade.
Bem armados, abastecidos pelos Estados Unidos e alguns países europeus, eles já empurraram várias unidades russas de volta para seu território.
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, e apesar de algumas potências (Estados Unidos, URSS, Reino Unido, França, China, Paquistão, India e Israel) terem se armado com bombas nucleares, ninguém ousou, e ninguém ousará usá-las.
Vamos aos fatos:
No ano de 1953, em resposta a uma invasão da Coreia do Sul pela Coreia do Norte, os Estados Unidos, que detinham o maior poder bélico do mundo, entraram na península para tomá-la e unificá-la sob sua influência.
Após três anos de luta, ambas as frentes, a exemplo dos ucranianos, defendendo solo pátrio, a guerra terminou empate, com um cessar-fogo.
É verdade que o General americano Douglas MacArthur, comandante militar do Japão, quis usar armas nucleares na guerra da Coreia, mas foi impedido por Harry Truman (por sinal, o único que usou bombas atômicas pra valer, em Hiroshima e Nagasaki), após uma tensa conversa entre os dois em Honolulu.
Eisehower, sucessor do Truman, obteve a autorização do congresso para intervir no Laos. Intervenção essa que se expandiu para o Vietnã e transformou-se numa prolongada guerra que durou vinte anos.
Bombardeiros americanos lançaram sobre o Vietnã o dobro de toneladas de bombas jogadas sobre a Europa na Segunda Guerra. Isso não impediu que sofressem uma derrota vexaminosa, já que o outro lado defendia solo pátrio. E isso faz toda a diferença.
Em nenhum momento, os ocupantes da Casa Branca cogitaram usar seu arsenal nuclear, que pulverizaria Hanoi.
No natal de 1979, o poderoso exército vermelho invadiu o Afeganistão, para manter em Cabul um governo comunista. O que parecia ser uma rápida intervenção transformou-se numa guerra sangrenta de oito anos, com soldados soviéticos combatendo, nas montanhas afegãs, os guerreiros sagrados do Islã, financiados e armados pelos Estados Unidos.
Entre esses guerrilheiros apoiados pela CIA, estava a Al-Qaeda, que mais tarde seria a mentora dos ataques de 11 de setembro de 2001.
Apesar de terem levado uma surra dos afegãos, que defendiam solo pátrio, os soviéticos em nenhum momento pensaram em usar seu arsenal nuclear.
O mesmo aconteceu com Israel, num momento em que a guerra de Yom Kippur parecia perdida para o Egito e a Síria. Nessa ocasião, o estado judeu poderia desaparecer do mapa. Mesmo assim, a primeira-ministra Golda Meir recusou a sugestão do seu ministro da Defesa, Moshe Dayan, de lançar bombas nucleares sobre Cairo e Damasco.
"esqueça isso", foram as palavras da Sra. Meir. *
Após o 11 de setembro, os Estados Unidos iniciaram uma guerra contra o Afeganistão, guerra que durou 20 anos e terminou com uma fuga desastrada no aeroporto internacional de Cabul, isso já no governo Joe Biden.
Sem uso de ogivas nucleares.
Ou seja, Putin jamais lançará bombas atômicas sobre a Ucrânia. E mesmo que quisesse fazê-lo, seus generais o impediriam.
Por tantas razões, acredito que a guerra ucraniana, pelo menos na frente territorial possa terminar com um acordo entre as partes, mas o Estado de Guerra hobessiano pode avançar décadas pela frente, a exemplo de outras fronteiras como a Caxemira e o mar do sul da China.
O cessar-fogo provisório das duas Coreias fez 70 anos em 2023.
E a capacidade acumulada do arsenal nuclear no mundo já destruiria o planeta terra um milhão de vezes. Por mais vexaminosa que seja uma derrota hoje, a fronteira da guerra nuclear segue muito bem defendida.
Daniel Camargo é economista, consultor de várias empresas.