Mr. X: tudo ou nada - Elio Gaspari
Numa época em que a Petrobras está debaixo de chumbo, faça-se justiça ao seu corpo técnico, ali nunca se acreditou nas mágicas do Mr. X.
Está chegando às livrarias “Tudo ou nada — Eike Batista e a verdadeira história do grupo X”, da repórter Malu Gaspar. Quem quiser sapeá-lo numa livraria pode ler as duas primeiras páginas do prólogo. Depois disso, será impossível parar.
Ali está a história do circo de Eike Batista, o “Indiana Jones brasileiro”. Com uma fortuna de US$ 27 bilhões em 2010, ele foi o homem mais rico do Brasil, oitavo do mundo. Quebrou três anos depois.
Depois do colapso do Império X, pode-se pensar que a explicação está na personalidade megalomaníaca, espetaculosa e excêntrica de Eike. É pouco. Ele encomendava mapas astrais das almas alheias. O banqueiro Siegmund Warburg não contratava diretor sem que uma grafóloga estudasse sua caligrafia. Cornelius Vanderbilt fez a maior fortuna dos Estados Unidos e, na velhice, aconselhava-se com uma vidente. Nenhum dos dois quebrou.
“Tudo ou nada” mostra a confluência de intere$$e$ que geraram o mito. Não saiu ouro suficiente de suas minas gregas, nem petróleo dos campos da OGX. A mineradora que vendeu à Anglo não valia US$ 5,5 bilhões.
Tudo bem, mas os bancos ganharam centenas de milhões de dólares intermediando suas operações (R$ 268 milhões só no lançamento das ações da OGX). Sempre houve quem avisasse que os negócios eram radioativos, mas ouvi-los seria duvidar do mundo e do Brasil de Lula.
Quando as ações da OGX caíram para 23 centavos, tendo valido R$ 23,27, a festa acabou. Ninguém quis lembrar que a história terminara como começara: 13 anos antes, no Canadá, as ações da TVX que chegaram a valer US$ 74 caíram para US$ 0,27.
O mérito de “Tudo ou nada” está em mostrar que a curva da fortuna de Eike Batista era acompanhada por condutas lineares e previsíveis. Ele dizia que seus negócios eram “à prova de idiotas”. Dava-se o oposto, mas era preciso que houvesse também ganância.
Malu Gaspar destrinchou as operações e fantasias do império de Eike e de sua “guarda pretoriana”. Expôs quanto dinheiro se ganhou à sua custa, a sonolência da Comissão de Valores Imobiliários (“xerife sem pistola”) e a manipulação dos mitos de celebridades.
Numa época em que a Petrobras está debaixo de chumbo, faça-se justiça ao seu corpo técnico, ali nunca se acreditou nas mágicas do Mr. X.
A narrativa de “Tudo ou nada” e a qualificação profissional de Malu Gaspar concedem-lhe crédito. Ainda assim, o livro tem um problema. Suas referências bibliográficas são insuficientes para amparar as descrições de cenas e diálogos que conta.
Elas se baseiam em 106 entrevistas com personagens do serpentário X, mas não há uma lista dos entrevistados. Além disso, fica esclarecido que uma conversa de duas pessoas não foi necessariamente contada por uma delas. Eike Batista não quis falar.
Fonte: O Globo