O mundo onde viviam ficava agora, durante dias inteiros, coberto de nuvens que os cercavam como um estendal de roupa molhada, em tons de cinzento, verde, azul, segundo o ângulo dos raios de Sol que o atravessava. Todas as tardes, faziam um passeio até ao precípicio, e sentavam-se numa rocha a admirar a paisagem que cintilava abaixo delas durante as imprevisíveis abertas ou a observar a maneira como o vento arrancava um farrapo do véu de bruma, deixando entrever uma nesga de céu limpo.
Passaram uma noite inteira a ouvir, por cima das suas cabeças, o som ténue do voo de bandos de cegonhas demandando, de partida para o Egipto, com os seus longos pescoços e as suas grandes asas, outros céus mais clementes. As torrentes transbordaram e os gritos dos pássaros misturaram-se ao som musical da água que corria entre pedras, troncos, líquenes e musgos.
No sentido mais vital e mais profundo, nada havia a dizer: não havia balanço a calcular nem juízo a emitir sobre aquilo que começara a viajar através deles, o tempo em estado puro, como a água que passa silenciosamenteentre os dedos que, borda fora, alguém deixa mergulhada na corrente. A própria neve, ao chegar, parecia fazer parte da ordem e do ritmo do pequeno universo que os envolvia.
Os leves flocos amontoavam-se contra as paredes da casa onde viviam, cintilando ao sol como miríades de gotas de orvalho subindo, por fim, até à altura do telhado do estábulo que Truman construíra para abrigar as ovelhas e a vaca. Também esses animais tinham descoberto uma passagem através do labirinto, e também para eles a felicidade deixara de ser um problema.