Um congresso processar e julgar um presidente da República e afastá-lo do cargo por Impeachment em apenas dois dias, isso sem mexer uma vírgula na Constituição, é algo impensável e inaceitável em qualquer nação que queira ser chamada de Democracia. Menos no Paraguai, onde ocorreu o fato! Só mesmo quem não conhece nada de história pode se assustar com o que aconteceu no vizinho e mal-afamado país sul americano!
O Paraguai esperou 182 anos, após sua independência em 1811, para ter o primeiro presidente eleito pelo voto, fato que veio a acontecer em 1993, com a eleição de Juan Carlos Wasmosy. Até então o país vinha sendo governado por uma sucessão de tiranos e por um único Partido, o Colorado. O último ditador, Alfredo Stroessner, filho de alemães, simpatizante e acolhedor de nazistas, governou o país por 34 anos.
Logo após o início de sua frágil democracia, um presidente eleito, Raul Cubas, foi forçado a renunciar por ter mandado matar o seu vice-presidente. Em 2008, um bispo da Igreja católica, e membro da teologia da libertação, Fernando Lugo, foi eleito, quebrando a hegemonia do partido Colorado, que já durava sessenta anos.
“Devasso como um símio”, como diria Shakespeare, logo após sua posse apareceram várias mulheres se dizendo mães de filhos de Lugo – quatro crianças, na verdade – todas suas ex-amantes, uma delas, inclusive, menor de idade. Tudo ficou provado, e nem Lugo negou. Em 2004 ele perdeu seu título de bispo da igreja católica por isso.
No governo de Lugo, o Paraguai conheceu índices espetaculares de crescimento econômico, chegando a incríveis 15% em 2009. Mas acabou estagnando, muito embora os paraguaios nunca tenham vivido tão bem quanto agora.
País extremamente católico, onde a igreja sempre se confundiu com o Estado, foi governado desde a descoberta pelos jesuítas, até sua independência da Espanha. O país por alguns momentos pareceu que daria certo, até que foi sufocado pelo crescimento da vizinha província de Buenos Aires, a futura Argentina. Foi aí que o país mergulhou em ditaduras brutais, até encontrar em Francisco Solano Lopez, o maior de todos os tiranos.
Aí começou a verdadeira devastação daquilo que já era um simulacro de nação. Em 1865 começa a Guerra do Paraguai, contra a Tríplice Aliança, entre Brasil, Argentina e Uruguai. Foi uma daquelas guerras estúpidas que durou cinco anos e exauriu a nação já pobre de tudo. Estima-se que dois terços da população masculina tenham morrido na guerra, que só terminou com o ditador morto. Daí pra frente o Paraguai foi apenas um aglomerado de pessoas simulando um Estado. Ainda assim, eles se envolveram em uma guerra com a Bolívia, a Guerra do Chaco, no começo do século XX.
Sem saída para o mar, quase um satélite do colosso Brasil, tendo na usina hidrelétrica de Itaipu uma grande fonte de renda, o Paraguai é o paraíso da falsificação, quase de tudo de fajuto pode ser encontrado pelos brasileiros que atravessam a Ponte da Amizade. Calcula-se que mais de um quarto da frota de automóveis do país seja de carros roubados no Brasil. Apresentando elevados índices de corrupção, a nação sul americana ainda tem um sério problema agrário. O que acabou gerando o fato que derrubou o presidente.
Fernando Lugo reagiu pacificamente ao seu afastamento. Talvez porque seu mandato já estava próximo de terminar, muito embora ele parecesse querer aprovar sua reeleição. Dificilmente Fernando Lugo voltará presidência do país. Ele foi destituído quase que por unanimidade pelo Congresso.
Agora, é ver se o vice-presidente empossado conseguirá que as outras nações sul americanas reconheçam seu governo. Os paraguaios não reagiram com violência à destituição de Lugo.
Um nó foi desatado. E ninguém sabe o que vai acontecer. Pobre Paraguai!
Theófilo Silva é articulista e colaborador de vários blogs e jormais do Brasil, presidente da Sociedade Shaekespeare e autor do livro 'A paixão segundo Skakespeare'.