USA e a guerra de 3 trilhões de dólares
Blog do Argemiro Ferreira
O cálculo foi atualizado pelos professores Joseph Stiglitz e Linda J. Bilmes. Segundo o novo livro deles, a estimativa do custo da guerra do Iraque eleva-se agora a US$ 3 trilhões. O título do livro, lançado esta semana, é este: “The three trillion dollar war” – ou seja, “A guerra de três trilhões de dólares”.
Tenho acompanhado desde janeiro de 2006 o trabalho dos dois. É pesquisa séria e rigorosa. Stiglitz, hoje professor da Universidade de Columbia, foi economista-chefe do Banco Mundial e ganhou o prêmio Nobel de Economia (2001) depois de criticar a instituição e deixar o emprego. Bilmes, ex-secretária assistente do Comércio, é professora de finanças públicas da Kennedy School of Government, na Universidade de Harvard.
“Quando fomos à guerra, o governo Bush disse que iria custar entre US$ 50 bilhões e US$ 60 bi”, lembrou Stiglitz em entrevista à BBC de Londres. Na época, um economista da Casa Branca, Larry Lindsey, foi demitido por ter dito que o custo podia chegar a US$ 200 bilhões. O governo achou o número exagerado, disse que era “uma bobagem”.
A beligerância ensandecida
A 10 de janeiro de 2012 passado esta coluna falou pela primeira vez dos dados iniciais de Stiglitz e Bilmes (a estimativa de custo da guerra ficava então entre US$ 1 trilhão e US$ 2,2 trilhões). Ao dar a agora a nova dimensão do custo, Stiglitz explicou que um sexto da quantia seria suficiente, por exemplo, para resolver todos os problemas de seguridade social dos EUA pelos próximos 50 a 75 anos.
Observou ainda que atualmente os EUA destinam US$ 5 bilhões de ajuda à África por ano, o que representa o custo de apenas 10 dias de guerra no Iraque. Se incluídos os outros custos, seriam sete a oito dias contra um ano inteiro de ajuda à África. “E pelo custo de duas semanas de guerra poderíamos acabar com o analfabetismo no mundo”, afirmou Stiglitz.
Ao comparar a guerra de Bush com outras nas quais os EUA se envolveram antes, disse: “Esta é a segunda maior dos EUA, depois do Vietnã. E a segunda maior em custo, depois da II Guerra Mundial. Mas quando a estimativa é de custo por soldado, a do Iraque é maior.” Na II Guerra 16,3 milhões de soldados americanos lutaram nos quatro anos. Em valores reajustados para 2007, o custo foi de US$ 100 mil por soldado. E no Iraque, US$ 400 mil por soldado.
Efeito macabro da maluquice
Uma das diferenças que contribuem para elevar o custo é que em geral o número de soldados feridos numa guerra corresponde a duas vezes o número de mortos. Mas na guerra do Iraque o número de feridos chega a 15 para cada soldado morto. E os feridos são, em grande parte, problemas que os EUA terão de enfrentar nos próximos 50 anos – acréscimos ao custo da guerra.
Stiglitz explicou à BBC que ele e Bilmes resolveram escrever o livro porque, entre outras coisas, queriam tentar mostrar o que está acontecendo com as famílias em consequência da guerra. “A devastação é grande. Em uma de cada cinco famílias com um soldado incapacitado, uma pessoa terá de deixar o emprego para poder cuidar dele”, afirmou.
A guerra tem participação ainda no desaquecimento da economia americana e possível recessão. Como o custo é alto demais, para “escondê-lo” o governo relaxou as políticas de monitoramento e regulamentação, estimulando uma bolha de consumo, em especial no mercado imobiliário. “Compramos tempo com empréstimos. O tempo acabou e estamos agora diante de uma desaceleração da economia e, possivelmente, uma recessão”.
Lembrou Stiglitz ter a guerra elevado muito o preço do petróleo, o que é dinheiro jogado no ralo. “Esse foi um dos problemas maiores da guerra na economia. “Antes dela o barril custava US$ 23 a US$ 25 e as bolsas de futuro acreditavam que a cotação permaneceria estável na década seguinte. Agora o preço chega a US$ 100, principalmente por causa das incertezas geradas pela guerra”.
Como o país foi enganado
Perguntado se os americanos teriam uma atitude diferente em relação à guerra se soubessem antes qual seria o custo, Stiglitz disse acreditar que sim. “Se soubessem que teriam de pagar uma conta de US$ 3 trilhões com um resultado incerto – talvez haja paz no Oriente Médio, talvez não – teriam pensado: `Será que não podemos pensar num modo melhor de fazer isso?’”
Os custos da guerra são colossais – em sangue e dinheiro – e vão continuar por gerações, segundo afirmou Stiglitz na introdução do livro. “Ao examiná-los será possível entender melhor as implicações da guerra e talvez compreender como poderemos nos livrar do Iraque com o mínimo possível de danos. Pagamos um preço alto por invadir o país. As baixas são apenas o fardo mais visível.”
O preço em dinheiro não é tão aparente, conforme explicou: “As despesas atuais, largamente financiadas por empréstimos, foram grosseiramente subestimadas, embora as enormes somas usadas não tenham sido suficientes para alcançarmos nossos objetivos ou proteger os soldados. Os custos futuros, que continuarão em escalada, mesmo depois da volta dos tropas, tinham sido deliberadamente falsificados”.