O Universo Elegante - Guilherme Bittencourt
A física moderna apóia-se em dois pilares: a teoria da relatividade geral, que explica o universo em grande escala (planetas, estrelas, galáxias), e a Mecânica quântica, que descreve-o em escala microscópica (partículas, átomos, moléculas). A primeira deve-se a Albert Einstein que no início do século XX subverteu a visão científica do universo ao estender a teoria gravitacional, originalmente proposta em 1687 por Isaac Newton, com o conceito de relatividade do tempo. A segunda teve origem na teoria eletromagnética, proposta em 1865 por James Clerk Maxwell e, tal qual a teoria de Einstein, representou uma verdadeira revolução conceitual, desta vez ao introduzir a probabilidade como única descrição possível do mundo sub-atômico.
As primeiras idéias surgiram em 1900, propostas por Max Planck, e nos anos seguintes foram aperfeiçoadas por físicos como Einstein (sempre ele), Werner Heisenberg, Paul Dirac e Erwin Schrödinger. Ambas as teorias são capazes de prever fenômenos físicos, dentro de seu respectivo campo de atuação, com uma precisão inimaginável, no entanto esta história de sucesso esconde um fato perturbador: a relatividade geral e a mecânica quântica não podem estar certas ao mesmo tempo. Isto significa que a física moderna não é capaz de prever o que acontece em situações onde uma grande quantidade de matéria está confinada em um espaço muito pequeno, como no interior de buracos negros ou logo após o Big bang, a explosão que deu origem ao universo.
A boa notícia que nos traz o livro O Universo Elegante: supercordas, dimensões ocultas e a busca da teoria definitiva de Brian Greene (Companhia das Letras, 2001) é que está em gestação a Teoria das supercordas, ou simplesmente Teoria das cordas, uma teoria capaz de unificar a descrição física do universo, realizando o sonho perseguido em vão por Einstein em seus últimos trinta anos de vida: a construção de uma Teoria sobre tudo. A má notícia é que de acordo com a teoria das cordas o tecido microscópico do universo é um labirinto com mais de dez dimensões, a maioria das quais dobrada sobre si mesma dentro de volumes minúsculos, cuja descrição matemática é tão complicada que até hoje só se conhecem equações aproximadas da teoria.
Mas estas dificuldades não assustaram Greene quando escolheu esta área da física como campo de atuação, área na qual colaborou com diversas descobertas. Também não o intimidou o enorme desafio de apresentar, de maneira compreensível para leigos, tal complexidade. Ao leitor pede-se que não esmoreça e encare a leitura com a mesma coragem, a recompensa vale a pena: chegar mais perto de compreender como funciona o universo.
Em resumo, a teoria de cordas afirma que todas as maravilhas que ocorrem no universo surgem das vibrações de uma simples entidade: minúsculos laços ou cordas profundamente escondidos no coração da matéria. Os diferentes padrões de vibração destes laços seriam a origem da diversidade do mundo sub-atômico. A ambição final da teoria é explicar os valores das diversas constantes que aparecem nos modelos físicos (a velocidade da luz, a massa e carga das partículas elementares, a relação entre as intensidades das diferentes forças, etc.), que atualmente devem ser determinados experimentalmente, como decorrência da teoria.
Além de relatar a história científica por trás da busca desta teoria final, Brian Greene descreve também o lado humano, a emoção de participar da construção do que será a verdade futura a respeito da essência do universo, as disputas e a colaboração, a decepção com o fracasso e a emoção com cada nova descoberta. Como pano de fundo, idéias revolucionárias e excitantes tais como novas dimensões escondidas no tecido do espaço, buracos negros que se transformam em partículas elementares, cortes e furos no contínuo do espaço-tempo, universos gigantes que se trocam com outros minúsculos, e toda uma variedade de outros aspectos que desempenham um papel essencial na compreensão de algumas das questões mais profundas de todos os tempos.
Se a complexidade do assunto parece desanimadora, isso deve-se ao desconhecimento do verdadeiro talento do autor para a metáfora e para as imagens mentais. Sem perder de vista o rigor técnico, Greene esgrima descrições e figuras que, se não são suficientes para tornar evidente o que são espaços de seis dimensões de Calabi-Yau, nos levam muito próximo da idéia geral do que poderá vir a ser a teoria final sobre tudo. Um exemplo: para explicar o que seria uma dimensão recurvada sobre si mesma, Greene nos convida a imaginar uma mangueira, que vista de longe é uma simples linha reta, unidimensional, mas para uma formiga que caminha sobre sobre sua superfície é um espaço bidimensional encurvado. Basta agora encolher a mangueira alguns milhões de vezes e teremos a trama íntima do tecido do espaço tempo.
O livro é dividido em cinco partes e quinze capítulos. A primeira parte corresponde à introdução (capítulo 1, vibrando com as cordas) e a quinta à conclusão (capítulo 15, perspectivas). As três partes centrais tratam, respectivamente, das teorias "clássicas" -- a relatividade geral e a mecânica quântica --, da teoria das supercordas e, finalmente, das implicações desta teoria no que diz respeito à estrutura do espaço-tempo. Apenas a leitura da segunda parte (o dilema do espaço, do tempo e dos quanta, capítulos 2, 3, 4 e 5), um curso resumido mas completo sobre os fundamentos da física moderna, já vale o investimento. O livro inclui ainda notas, glossário de termos científicos, referências e sugestões de leitura, e índice remissivo.
Brian Greene licenciou-se em Harvard e doutorou-se em Oxford. Foi professor na Universidade de Cornell, tendo sido nomeado professor catedrático em 1995, e em 1996 transferiu-se para a Universidade de Columbia onde é atualmente professor de física e de matemática. É considerado um dos grandes cientistas no campo da teoria das cordas, tendo realizado um grande número de descobertas revolucionárias neste domínio.