Quem disse que precisamos ter opinião sobre tudo?
Alexandre Matias - O Estadao.com.br
Wando morreu. E eis que, no dia de sua morte, em meio ao luto súbito e homenagens póstumas de toda ordem (desde versões ilustradas para o hit “Fogo e Paixão” até piadas sobre um dos temas favoritos do cantor, as calcinhas), o blog Não-Salvo – um dos maiores blogs de humor do Brasil – postou uma foto do Sidney Magal em sua página no Facebbok. Sobre a foto, um texto anunciava “Wando (1945-2012)” e citava um trecho da música “Borbulhas de Amor”, do Fagner.
Não era um erro. Foi de propósito, afinal o motivo era brincar com o fato de que as pessoas acabam confundindo determinadas informações e, no calor da hora, misturam lé com cré.
Os leitores do blog não só entenderam a piada como a passaram para frente, compartilhando a imagem em seus perfis na rede social. Mas como nem todo mundo conhece o site ou foi avisado de que aquela imagem veio de um site de humor, não faltaram comentários que não apenas corrigiam a imagem (“esse não é o Wando!”) como agrediam rispidamente a “ignorância” de quem postou a informação “errada”.
(Cabe um parêntese rápido sobre essa agressividade típica da internet. Uma vez que não há o contato próximo, é muito comum que se aproveitem desta frieza e distância da comunicação online para a exibição de uma fúria ameaçadora. Antes do Facebook, reclamações, acusações e ameaças ficavam escondidas sob o fato de que não era preciso se identificar para fazer comentários em sites ou blogs. Depois do Facebook, em que a identificação é capital, essa raivinha foi transformada em exibicionismo de opinião, com pessoas debatendo interminavelmente – e apaixonadamente – sobre qualquer assunto que vier à pauta. Seja um animal morto, uma declaração de um político, o resultado de um jogo ou um programa de TV – todo mundo tem opinião formada sobre qualquer assunto. Depois dos trending topics do Twitter, agora temos a polêmica do dia, no Facebook).
Mas é tudo uma questão de contexto. Como observa o fundador do site BuzzFeed, Jonah Peretti, o Facebook e as redes sociais em geral misturam notícias sérias e fúteis no mesmo ambiente – afinal, tais notícias interessam a qualquer um. Mas uma coisa é reclamar que a foto exposta não é do Wando e sim do Sidney Magal. Outra coisa é sair compartilhando qualquer tipo de informação sem checar de onde ela vem. É um exercício natural à prática do jornalismo que, aos poucos, está sendo repassado para todo o público não-jornalista.
É fácil acabar com a reputação de uma pessoa em alguns posts no Facebook. O que aconteceu com a Luíza, aquela, do Canadá, poderia não ser engraçadinho e curioso – e, sim, trágico, caso o tema fosse diferente de um pitoresco comercial de TV. Misture isso ao fato de que muitos passam para frente notícias sem nem mesmo checar de quando elas são e que há proliferação de sites de humor que fingem ser publicações jornalísticas e temos um trem saindo dos trilhos em nosso inconsciente.
Talvez seja a avalanche de informação, talvez seja algo que eu chamo de “a ressaca da web 2.0” (que permitiu a qualquer um dizer o que pensa online – e agora estamos vendo todo mundo dizer o que pensa só pelo simples fato que é possível dizer o que se pensa o tempo todo). Há a clássica frase de Gilbert Chesterton que, no começo do século 20, disse que “não foi o mundo que piorou, as coberturas jornalísticas é que melhoraram muito”.
Essa sensação de euforia e paixão – que pode ser boa ou ruim – é uma espécie de desdobramento da constatação de Chesterton. Tanta informação faz que a gente queira acompanhar esse ritmo da mesma forma, mas vale o novo ditado “Google before you tweet is the new think before you speak” (“Usar o Google antes de twittar é o novo pense antes de falar”). Sem um mínimo de ponderação, mergulhamos de cabeça no redemoinho de informação que parece nos puxar para baixo. Mas essa força não age sozinho – é preciso que você dê o primeiro passo. Por isso, calma.