A economia do Japão - Daniel Camargo
No de fevereiro deste ano, o Índice Nikkei, principal indicador da bolsa de valores de Tóquio, composto pelas maiores empresas japonesas, atingiu (e renovou), seu topo histórico, que havia sido formado em 1989. Sim, o Japão demorou 35 anos para voltar a atingir o nível recorde de preço de capitalização das suas empresas. Este colunista, que vos escreve, estava nascendo, quando o Japão estava naquela crista da onda, que volta a ser testada.
Via de regra, renovar topos históricos está associado à descargas de euforias e expectativas com os mercados, e os países envolvidos. Contudo, o Japão o fez precisamente no mês em que entrou em recessão técnica. Recessão que o fez perder o posto de terceira maior economia do mundo para a Alemanha. Já havia sido ultrapassado pela China em 2010, quando saiu do segundo para o terceiro lugar. Um detalhe flagrante: a Alemanha não está nem um pouco pujante, ao contrário, também está em recessão técnica. O Japão foi ultrapassado por uma economia em estado inercial.
E para mais comparações, à altura do primeiro topo, em 1989, o Japão era o primeiro tigre asiático, com a segunda maior economia do mundo (alimentou-se um risco real de ultrapassar a economia americana na década seguinte, que deixou a Casa Branca, por muitos anos, de cabelo em pé). O país possuía as três maiores companhias fabricantes de chips do mundo: NEC, Toshiba e Hitachi. Hoje, nenhuma das 10 maiores empresas globais de chips é japonesa, com destaque para a TSCM, de Taiwan, que está no centro de uma disputa geopolítica por conta da seu protagonismo no setor.
Não para por aí! Em 1989, das 30 maiores empresas do mundo em capitalização, 21 eram japonesas, incluindo todas as empresas do top 5. Voltando ao presente, nenhuma das 30 maiores empresas do planeta, de hoje em dia, está sediada em solo japonês. Nem mesmo a sua respeitada indústria automobilística conseguiu permanecer no topo.
O topo de 2024 é a antítese do topo de 1989. Talvez a definição mais precisa do que é o Japão hoje: Um paradoxo.
Se não há atividade econômica que justifique o rally da bolsa japonesa, talvez sejam as expectativas que estejam fomentando os investidores? Não é o que os números revelam.
Em 2023, o número de nascimentos caiu 5,1% em relação ao ano anterior, que também já havia reportado queda, enquanto o número de casamentos diminuiu 5,9% - a primeira vez em quase 100 anos que o país registra menos de 500 mil casamentos. Um mau presságio: nascimentos fora dos casamentos são raros na tradicional cultura japonesa. As taxas de natalidade estão em espiral negativa.
Enquanto alguns países com problemas demográficos similares, tais como Alemanha e Itália, tentam compensar as baixas taxas de natalidade com atração de imigrantes, o Japão não consegue esse luxo. É provavelmente o país mais conservador do mundo nos costumes, e com toda a certeza, é o país mais idoso do mundo.
O Japão possui uma Histórica singular: O único epicentro civilizacional do mundo jamais invadido por uma outra civilização, um estrangeiro. Talvez aí está o cerne de sua coesão e homogeneidade, e também de sua vulnerabilidade: o estrangeiro.
Sem conseguir importar pessoas, o Japão tem seu futuro ameaçado. E não, o Índice Nikkei não voltou bater topo histórico porque suas empresas voltaram a se valorizar. O fez isso porque sua moeda se desvalorizou. O império do sol nascente de 1989 é o império do sol poente de 2024.
Daniel Camargo é economista e colaborador deste Blog