Como o Brasil poderá se beneficiar da crise
É inútil a discussão sobre quanto a economia crescerá este ano ou nos próximos. É evidente que o país será afetado pela crise internacional, que sofrerá menos do que em 2008 e que há uma tática de curto prazo para amenizar os efeitos da crise.
A questão é outra.
Nas grandes crises do século 20, o Brasil foi beneficiário, permitiu-se grandes saltos de desenvolvimento.
A crise de 1929, ao estancar o financiamento externo, obrigou Vargas a impor limites ao livre fluxo de capitais. A consequência foi os grandes capitais nacionais caírem na economia real, através dos bancos comerciais ou na implantação de fábricas, acelerando substancialmente o processo de substituição de importações.
A Segunda Guerra permitiu ao país acordos bastante vantajosos, antes da eclosão do conflito; um grande acúmulo de reservas, no decorrer da guerra; a importação de cérebros valiosíssimos, que ajudaram a completar a ciência nacional. E, depois, a importação de fábricas de veículos europeias, que ficaram disponíveis após o plano Marshall.
A crise externa dos anos 70 levou Geisel aos grandes investimentos do 2o Plano Nacional de Desenvolvimento que, apesar do endividamento remanescente, completou o quadro de industrialização do país.
Hoje em dia, o Brasil virou foco de atenção das maiores empresas e economias do mundo por um ativo fundamental, ainda mais nesses tempos de crise: seu mercado interno. Em todos os setores há uma enxurrada de capitais chegando, em busca do porto seguro da demanda assegurada pelo Brasil.
A estratégia brasileira deveria se desenvolver nas seguintes frentes:
1. Exigência de contrapartida das empresas que aspiram o mercado interno brasileiro.
2. Política monetária e fiscal visando realocar os ativos financeiros - hoje em grande parte girando a dívida pública - para investimentos na economia.
3. Estratégias de inserção global, não apenas das multinacionais brasileiras, mas de cadeias produtivas inteiras - com prioridade para América Latina e continente africano.
4. Estratégia específica de internacionalização dos bancos brasileiros, aproveitando o desmonte do sistema bancário dos países centrais.
5. Plano integrado de logística transcendendo as obras do PAC (Programa de Aceleração do Desenvolvimento), com enfoque nas novas zonas de crescimento dinâmico da América do Sul.
Não é hora de se contentar meramente em minimizar os efeitos da crise sobre a economia. É hora de planejar o salto.
A lição de casa já começou a ser feita. Os programas de transferência de renda estão consolidando o novo mercado de consumo. Já existe mobilização pela inovação e pela educação. As Conferências Nacionais deram uma solidez inédita ao tecido social brasileiro, nos mais diversos setores. A diplomacia já conseguiu seu aggiornamento, incluindo o pragmatismo comercial e a visão estratégica em seus estudos. Já existe uma musculatura financeira, no mercado de capitais, BNDES e fundos de private equity.
Só falta juntar todos os agentes e passar a pensar grande.